Os Dom Quixote de Bruxelas ( El País)
As medidas aprovadas na cimeira de 30 de janeiro - o tratado de estabilidade e o
plano de crescimento económico - servem, na melhor das hipóteses, para reparar
os erros cometidos no passado ano e meio. No pior dos cenários, não passam de
mentiras, diz o colunista Xavier Vidal-Folch.
“Os
líderes dedicam grande parte do tempo das cimeiras a discutir como tiram a pata
da poça em que a meteram na cimeira anterior”, sussurra um protagonista da alta
política da UE.
A
inanidade das discussões circulares e recorrentes sobre a Grécia, Portugal ou o
tamanho do fundo de resgate confirmou ontem quão difícil é tirar a pata.
Fincada, pelo menos, desde que Merkel e Sarkozy libertaram da lâmpada
(Deauville, 19 de outubro de 2010) o duende da falência de um parceiro, oculto
na quitação (descida do valor das obrigações) aos seus credores
privados.
O
conclave deu duas magnas contribuições para a sequência de teimosias: a luz verde a um falso
Tratado de Estabilidade e a aprovação de um plano de crescimento que não é um
plano. Uma piada. Ou só parece ser?
Digamos
que o tratado é necessário para garantir a disciplina dos parceiros do euro e
desenhar, ou abrir caminho, às consequentes compensações a favor do crescimento.
Que é dizer muito.
O
Parlamento Europeu “expressa as suas dúvidas sobre a necessidade” do acordo
(resolução de 18 de janeiro) e o bom Wolfgang Munchau (Financial Times de 30 de janeiro )
multiplica-as: “É desnecessário”, porque as suas disposições podiam ser
acordadas pela via legislativa normal e porque “incentivará” as políticas
recessivas, demasiado restritivas.
Combatem
moinhos de vento ilusórios
Digamos
que não têm razão e que faz falta um tratado que corresponda ao seu pomposo
título “de Estabilidade, Coordenação e Governo na União económica e monetária”.
Pois bem, o texto só corresponde à ideia de “estabilidade”, de disciplina
orçamental. Falta o resto do título.
Há que
repetir à saciedade que apenas o artigo 9 (dos 16 existentes) manda “promover o
crescimento económico”. E prescreve que os subscritores “adotaram as ações e
medidas necessárias” para tal. Mas continua sem concretizar nenhuma. Continua
sem ter caráter obrigatório. Continua sem prever multas a quem não o fizer.
Continua sem ameaçar levar ao Tribunal do Luxemburgo quem não cumpra essa
obrigação…
E, em
contrapartida, tudo isso está estipulado ao milímetro contra quem não cumpra a
obrigatoriedade de reduzir o défice. É nessa assimetria que se estriba a piada.
Vende-se o produto como ferramenta para impulsionar os dois polos da política
económica e só se desenvolve um.
Mas há
mais. A quinta versão do texto, a que chegou ao conclave, é ainda mais retorcida
que a anterior. Os [novos] retoques são essenciais não porque o sejam, mas
porque o seu bizantinismo retrata como os inspiradores e redatores do textos
adoeceram: combatem moinhos de vento ilusórios (as mais recônditas vias de
incorrer em défice e contornar as sanções) como quixotes loucos.
Jogos de
malabarismo
Para a
boa gente não contagiada basta dizer que uma das obsessões desses retoques é a
de dar poder a qualquer governo para perseguir um parceiro incumpridor se a
Comissão se inibir. Talvez o texto seja necessário, amigo Wolfgang, mas será
inútil.
Porque
todas as atuações históricas neste âmbito, que marginaram ou minimizaram o poder
das instituições – desde a agenda de Lisboa de 2000 à rebelião de Paris e Berlim
para contornarem as sanções de Bruxelas por não cumprirem o Pacto de
Estabilidade em 2003 – desembocaram no local que ninguém quer recordar: a
irrelevância.
O outro
falso engodo é a “Declaração” para relançar o crescimento económico. O assunto
preocupa a dupla franco-alemã – a última a dar-se conta de que se o PIB baixa
não chega sequer para pagar as dívidas – desde a sua bilateral de 9 de janeiro,
a primeira ocasião em que propuseram trocar o cilício por vitaminas.
Berlim-Paris, Comissão e Conselho usaram, para isso, duas técnicas de comprovada
ineficácia. Uma, é tirar das gavetas (como na Agenda de Lisboa) os belos
propósitos e planos esquecidos: emprego juvenil, financiamento das
PMEs.
A outra é
passar o rastilho para o orçamento comunitário e recolocar as partes. O dinheiro
remanescente, não gasto no passado nem devolvido aos governos, não passa de uns
trocos, cerca de 30 milhões. E talvez seja precipitado reorganizar os 82 milhões
de euros dos fundos estruturais e de coesão ainda não atribuídos para os dois
anos (2012 e 2013) que restam das atuais perspetivas financeiras septenais. De
qualquer modo, é enganoso.
Esses
fundos já estão orientados para o crescimento: estradas, escolas, estações de
tratamento de lixo. E desde a “Estratégia de emprego do Luxemburgo” (1997) nem
um cêntimo deve ser dedicado a projetos que não criam emprego. Não há, por isso,
um único euro novo. Só jogos de malabarismo.
Emprego
Bem-vindos à Desempregolândia, o novo país-membro da
UE!
“Vinte
e cinco milhões de desempregados, uma população equivalente à de um país de
grande dimensão da UE. Bem-vindos ao 6º maior país da UE, a
Desempregolândia!”, exclama o România liberã, no dia seguinte ao Conselho Europeu de Bruxelas.
“Constituído maioritariamente por jovens entre os 18 e os 24 anos,
este país é uma prova viva de que as coisas se agravam, tendo em conta que a
economia europeia continua a deslizar para a recessão”.
Neste contexto, o diário de
Bucareste constata, com pena, que “foi o 16º em dois anos e apesar de os Vinte e
Sete terem finalmente discutido a retoma do crescimento e o relançar do emprego,
existem grandes hipóteses de mais uma vez se ter organizado uma cimeira em vão.
Os obstáculos e a divisão são omnipresentes".
Desempregolândia? E ao mesmo tempo quer a UE aumentar o número de imigrantes alógenos terceiro-mundistas no espaço europeu para trabalhar, dizendo que pode receber muitos mais do que já estão por aqui? Alguma coisa não está a bater assim muito bem...
ResponderEliminarNisso concordamos, FireHead.
ResponderEliminarSó há uma explicação (em Macau acontece o mesmo e pelo resto do Mundo também) - abrir as fronteiras para deixar entrar pessoas que vão desempenhar funções que os locais não querem/podem.
A não ser assim, deixar entrar pessoas para as condenar ao desemprego, tantas vezes conducente à criminalidade, é um erro crasso.
Resumindo, a ver se percebi, concordam e estabelecem dois pontos fundamentais, promover o crescimento económico e controlo do défice, mas só a segunda é que tem carácter de obrigatoriedade? Cheira-me que isso conduz a uma única solução: "Tudo a ir aos bolsos rapar o que ainda há por lá!"
ResponderEliminarEnfim... Parece um circo...
Percebeu perfeitamente, Catarina.
ResponderEliminarMais palavras para quê?
Faz-se o que é mais simples e mais rápido.