Golpe de Estado financeiro (Padre Anselmo Borges )
O pior que pode acontecer é o medo,
porque não há confiança nem horizonte a abrir caminho. Mesmo sem se ser
pessimista, percebe-se que a humanidade se encontra numa encruzilhada e é
preciso estar preparado para o pior.
Nestas circunstâncias, não bastam
boas intenções. É preciso reflectir e tentar ver claro. Deixo aí alguns
pensamentos sobre a crise, a partir de reflexões do teólogo José Ignacio
Calleja, prestigiado professor de Teologia Moral Social na Faculdade de Teologia
de Vitoria, num texto em que afirma precisamente que "há um golpe de Estado
financeiro no mundo, gerido por políticos", sendo necessário "impedir o fascismo
social, para poder sair da crise".
É verdade que a crise é também de
cultura moral e espiritual, mas não é possível avançar sem uma implicação séria
e a fundo na social. Não se pode pretender fugir ao problema social, invocando
apenas o caminho da crise espiritual e de valores. "Nada mais alienante e falso
do que a religião desencarnada."
Aí ficam, pois, algumas reflexões
fundamentais.
1. Na base, está "uma globalização
económica, gerida no quadro do neoliberalismo, que apodreceu especulativamente
todo o sistema financeiro e social". Para se ganhar dinheiro, este já não tinha
de passar pela produção, pois o lucro tornava-se incomparavelmente mais fácil e
vantajoso num mercado de capitais, "único, opaco e sem controlo sério". A
apregoada auto-regulação não funcionou e o vírus especulativo tudo infectou e
tornou-se incurável. Agora, há quem queira baixar a febre, mas, sem se ir às
causas profundas, não se consegue. Sem reconhecer as causas desses efeitos e "os
grupos sociais enriquecidos" que os protagonizam com vantagem, não se vai
lá.
2. Com o objectivo de encontrar
paliativos para esses efeitos, mas sem descer ao fundo do mal, "há um golpe de
Estado financeiro no mundo, com especial efeito nos elos mais débeis do sistema
dos ricos e subordinação das democracias e dos gestores políticos do momento ao
poder financeiro".
3. No sentido de pensar uma
resposta alternativa, J. I. Calleja apresenta algumas pistas.
Uma: "Impedir socialmente o que
alguns já chamam o fascismo social", ou seja, que cada sector da população,
encostando-se ao velho princípio do "salve-se quem puder e cada um que se
arranje", aceite tudo o que viola os direitos dos outros, desde que os nossos
não sejam afectados.
Outra tem a ver com a justiça e a
equidade nos impostos e com o modo como estão a ser repartidos os esforços e as
dificuldades, sem capacidade para tocar nos privilégios injustos inclusivamente
da classe politico-partidária. Entre parêntesis - lembro eu -, não se pode
esquecer que Portugal continua a ser um dos países ou mesmo o país da União
Europeia onde o abismo entre os muito ricos e os muito pobres é mais fundo. "Sem
uma reforma fiscal, orçamental e política profunda, não há saída para a
solidariedade, imprescindível hoje."
Em terceiro lugar, é necessário
aprofundar a convicção de que "não há saída, sem o controlo 'social-democrático'
do sistema económico e financeiro internacional e nacional, na sua opacidade,
desregulação, acumulação e 'soberania expropriada'". Os governantes do G20 não
se podem esquecer do que disseram no início da crise - Bento XVI juntou-se-lhes
com entusiasmo na sua encíclica "Caridade na Verdade" -, exigindo "refundar o
capitalismo, regular o sistema financeiro internacional, acabar com os paraísos
fiscais (aqui, lembro que os média davam conta nestes dias dos biliões dos
super-ricos nesses paraísos, sem pagamento de impostos), desenvolver a taxa
Tobin". De outro modo, não há democracia, pois o que fica é "a obediência a um
golpe de Estado financeiro".
Talvez não se esperasse a última exigência, mas
estou de acordo com ela e julgo que é fundamental. Escreve: Se se quiser uma
saída justa e duradoura, é imprescindível uma vida moderada, "o decrescimento no
desenvolvimento, para viverem todos com menos e bem". Isto é muito difícil
politicamente, mas é necessário a curto prazo. Nem os recursos nem o ecossistema
geral da vida nos permitem outra alternativa.
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
ResponderEliminarvoz a 0 db,
ResponderEliminarMas esse não é o papel do padre Anselmo Borges.
Para isso temos a comunicação social e a sociedade civil.
O papel do padre Anselmo Borges, e de outros como ele (hoje há mais) é apontar pistas.
Que outros devem seguir.
voz a o db,
ResponderEliminarA sua mensagem tinha vírus.
Fui obrigado a eliminá-la.
Verifique o que se passa, por favor.