Carta Aberta ao primeiro-ministro
ESTOU FARTO, SR. PRIMEIRO-MINISTRO
Sr. Primeiro-Ministro,
V. Exª não me conhece.
1 - Sou trabalhador do Estado, a minha esposa é enfermeira, tenho 2 filhos pequenos, não sou rico, vivo do meu vencimento (consecutivamente cortado de mil e uma maneiras) com o qual pago a prestação de uma casa simples (até aos 70 anos de idade), com imenso esforço, a prestação da minha viatura comprada em “leasing” a 10 anos, porque o dinheiro não dá para mais - na esperança de o poder pagar mais cedo - (para me poder deslocar para o trabalho que sempre foi longe de casa).
Não tenho bens patrimoniais nem heranças.
Procuro ser honesto, correcto, honrar os meus compromissos, de acordo com os meus valores ético-morais que adoptei, não só dos meus pais como também da Instituição que sirvo: os valores da honra, da dignidade.
2 - Dirijo-me a V. Exª na minha condição de cidadão português e de eleitor.
Após os descalabros sucessivos dos anteriores governos, acreditei em si, V. Exª inspirava-me confiança, parecia uma lufada de ar fresco neste terreno pantanoso em que se transformou o Portugal político-partidário.
Votei no seu colega de coligação no CDS, pois tinha a percepção de que os partidos políticos não teriam maturidade para terem maiorias (de acordo com o corrido no passado quer com o PSD, quer com o PS).
Sinto-me profundamente enganado, quer pelo Sr. Primeiro-Ministro, quer pelo Sr. Paulo Portas.
Explico porquê!
3 - Tenho 50 anos de idade, filhos para criar e já não tenho idade para ser enganado.
V. Exª mentiu-me (e eu acreditei), quando antes da campanha eleitoral garantiu, numa escola, que retirar os subsídios de férias e de Natal era um disparate e mera propaganda do partido adversário.
O Sr. Paulo Portas mentiu-me (e eu acreditei), quando foi fazer campanha eleitoral para um bomba de gasolina na fronteira com Espanha, dizendo que o que se passava em Portugal em matéria de preços dos combustíveis era um escândalo, e que resolveria o problema mal chegasse ao governo.
V. Exª disse que os sacrifícios seriam iguais para todos, que lutaria por justiça e equidade (e eu acreditei). Disse que a honestidade, a correcção, os valores pátrios, ético-morais, seriam um paradigma do seu futuro governo (e eu acreditei).
V. Exª prometeu transparência (e eu acreditei), veja-se o caso Miguel Relvas, o caso Ana Moura, por exemplo.
Fui enganado, sinto-me enganado e a réstia de esperança que tinha em muito poucos políticos desapareceu.
O aforismo popular de que “são todos iguais” deixou de ser mera conjectura subjectiva: tornou-se um facto de difícil discussão.
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4 – Estou farto, Sr. Primeiro-Ministro, que me falem de sacrifícios, de equidade, quando o Sr. Ministro da Solidariedade Social trocou uma vespa por um bólide caríssimo, no qual afronta a pobreza em que estamos.
Estou farto, Sr. Primeiro-Ministro, quando tenho um incentivo fiscal de 250€ para 2013, e para o ter tenho de gastar mais do que o meu vencimento, sendo tratado não como um cidadão mas como um mentecapto.
Estou farto, Sr. Primeiro-Ministro, que me fale de transparência, quando o seu braço direito, o Sr. Relvas, teve o caso que teve com o jornal Público, foi denunciado publicamente num canal de TV por Helena Roseta de a ter aliciado para favorecer uma empresa onde na altura V. Exª era o responsável, tem um curso que envergonha o país (apesar de legal, segundo dizem), e mentiu no caso das secretas no parlamento, segundo referem os “media”.
V. Exª é conivente, ao manter a confiança política num político que não inspira confiança.
Estou farto, Sr. Primeiro-Ministro, que me falem de igualdade, de equidade, de justiça, quando a classe política não dá o exemplo de austeridade ao povo, aliás, contrariamente, faz o oposto, em carros de luxo, menus de luxo a preço de cantina na Assembleia da República, aumentos encapotados sob a forma de ajudas de custo e / ou despesas de representação.
Estou farto, Sr. Primeiro-Ministro, que me mintam.
Há tempos o Sr. Ministro da Administração Interna referiu, pelo menos por duas vezes, que era preciso dizer ao povo que o plano da troika não visava o crescimento mas apenas a correcção da despesa. No entanto, o discurso inverso, de que este caminho de austeridade louca visa o crescimento, continua a ser injectado por V. Exª.
Estou farto, Sr Primeiro-Ministro, de maus exemplos por parte de quem deveria dar bons exemplos. Refiro-me em concreto às duas principais figuras do Estado português (a 2ª figura foi escolhida por V. Exª), que exercendo cargos de alta responsabilidade dispensaram os respectivos ordenados para auferirem chorudas reformas (mais de 7 mil euros por 10 anos de trabalho, a Srª Assunção Esteves).
Estou farto, Sr. Primeiro-Ministro, que me digam que tudo isto é dentro da Lei (que os senhores elaboram ao longo dos anos, para que possam fazer o que bem entendem).
Estou farto, Sr. Primeiro-ministro, dos ordenados escandalosos dos gestores públicos, enquanto V. Exª vai cortando o pouco que cada português da classe média, e por aí abaixo, auferem ao fim do mês.
Estou farto Sr. Primeiro-Ministro de ver inúmeros “especialistas” no governo de V. Exª, na casa dos 20 anos, a auferirem ordenados equivalentes, por exemplo, a um General em fim de carreira.
Estou farto, Sr. Primeiro-Ministro, que alterem as leis de acordo com os vossos interesses (refiro-me ao subsídio de férias e de Natal), quando ao que consta tal nem sequer foi imposto pela troika, e estava estatuído desde o tempo de Sá Carneiro (que falta fazem homens da sua fibra) que esses subsídios são inalienáveis e impenhoráveis.
Estou farto, Sr. Primeiro-Ministro, de haver leis para uns e leis para outros conforme as conveniências do momento.
Estou farto, Sr. Primeiro-Ministro, que me digam que tudo isto é inevitável pois sabe melhor que eu que não é.
O Sr. Miguel Cadilhe sugeriu há dias que se taxasse 4% sobre a riqueza líquida, numa única vez para amortizar a dívida pública.
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Porque não o faz V. EXª? De quem tem medo? Porque insiste em massacrar o povo português quando tem esta hipótese? Ou será que o Sr. Miguel Cadilhe alucinou (não acredito)?
5 – Da minha parte, e embora tenha votado no projecto comum PSD / CDS, não me revejo nesta teimosia de, alucinadamente, ir atrás de um número para o défice, nem que para isso o país morra de fome.
Como cidadão e eleitor, não votei nos senhores para fazerem isto, mas sim para fazerem o que prometeram.
Uma vez que me sinto enganado, não reconheço legitimidade democrática a este governo, pois quem o elegeu, fê-lo partindo dos pressupostos prometidos na campanha eleitoral, e não no tratamento desigual que estão a ter para com os cidadãos.
6 - É simplesmente execrável:
Que haja cidadãos de 1ª e cidadãos de 2ª;
Que a uns tenha sido cortado o vencimento e a outros não;
Que a uns tenham sido cortados os subsídios de férias e de Natal e a outros não;
Que uns tenham um determinado tratamento e haja regime de excepção para outros;
Que as classes mais favorecidas sejam poupadas em detrimento dos menos favorecidos;
Que eu tenha de andar a pagar os desmandos das entidades bancárias;
Que estas entidades não contribuam para o esforço nacional;
Que se mantenham inúmeros Institutos, quando foi prometido acabar com a maioria deles, observatórios, e outras instituições redundantes que por aí abundam.
É preciso coragem para servir o povo!
Estou farto Sr. Primeiro-ministro!
José Lucas
BI 7849415
jcmlucas@gmail.com
19 Julho 2012
PS – Ouvi na TV, V. Exª dizer que iria tirar uma semana de férias.
Eu não vou poder, mesmo pertencendo à ex-classe média, porque V. Exª tirou-me o subsídio de férias depois de estar no governo (após prometer não o fazer antes de estar no governo). Ficaria muito grato se V. Exª pudesse levar os meus filhos de 9 e 12 anos, com a família de V. Exª, para que possam usufruir de um pouco de praia.
Tenho outro problema: ainda não sei como vou comprar os livros para o próximo ano lectivo, mas isso é outra história, mais lá para diante…
Estimado Amigo Pedro Coimbra,
ResponderEliminarSimplemente fantástico a abertura desse senhor devia ser seguida por todos os portugueses, ou então que os Generais e os Almirantes se revoltem só assim poderemos ter de novo um país às doreitas, que sejam corridos essa corja de aldrabões de vigarista e se acabe com as leis que os protege.
E diga lá agora a tal senhora que Portugal não é um país de corruptos e mentirosos.
Apoio a 100% este senhor que escreveu essa carta aberta ao PM.
Abraço amigo
Já conhecia.
ResponderEliminarUma carta cujo conteúdo deve ser tido em atenção.
Amigo Cambeta,
ResponderEliminarEsta carta, com educação e elevação, mostra as dificuldades que muitos portugueses estão a enfrentar.
Mas também, e há que o reconhecer, muitos erros cometidos ao longo dos anos.
Viver a crédito.
Para tudo e mais alguma coisa.
Os créditos têm que ser saldados.
Com juros.
E a malta foi-se esquecendo disso.
É um tempo de mudança para todos.
Tem que ser!
Aquele abraço
Muita atenção, António.
Por quem governa, mas também porque quem se esqueceu que havia amanhã.
Tempo de mudança, António.
Uns não podem ser tão brutos (governo) porque já se percebeu que não resulta.
Outros têm que perceber que não podem gastar como gastaram (o que não tinham).
Caro Pedro Coimbra
ResponderEliminarUma carta que podia ser subcrita por muita (mesmo muita) Gente.
Abraço
Rodrigo
Sem dúvida, Rodrigo.
ResponderEliminarMuita gente se pode rever nesta carta.
Aquele abraço
Vale a pena recordamos que este governo só é governo porque alguém tinha prometido acabar com o desemprego em Portugal - e não é que Portugal nunca teve tantos desempregados como tem agora?
ResponderEliminarDemocracia é mesmo assim: paga o justo pelo pecador. Mas falem mal do Salazar que já não está por aqui entre nós para se defender...
Erros e mais erros, FireHead.
ResponderEliminarApontar o dedo a quem?
Temos que começar pelo D. Afonso Henriques e vir por aí abaixo.
Diz alguém de quem gosto muito - o passado já foi; o futuro vira; vamos viver o presente.
Acrescento - sem esquecer que o futuro vira.
Já tinha lido, mas nunca é demais relembrar...
ResponderEliminarHá uma coisa que eu não entendi, mas quem é que não teve cortes nos subsídeos de férias? Houve uma altura que eu ouvia trabalhadores da função pública revoltarem-se dizendo que tinham sido os únicos a quem havia sido feito um corte nos subsídios e isso é mentira, porque até aos que recebem por recibos verdes (que como se sabe não temos nada disso dos subsídios de natal e de férias) arranjaram um impostosinho sobre uma coisa que não temos, bem não me queria perder neste assunto mas foi algo que nunca entendi.
ResponderEliminarTudo o resto, há cidadãos de primeira e de segunda, pois claro que há, e os cidadãos de primeira não estão todos no governo, ouvi dizer há tempos que há para aí uns manganos que recebem mais do que um subsídio de reinserção e etc etc e essas coisadas todas afligem-me bastante... Mas adiante...
Uma carta digna, Carlos, um grito de revolta!!
ResponderEliminarPoppy,
Essa perguntas só têm uma resposta - as excepções, ao contrário do sol, quando nascem não são para todos.
Porque, como escrevia o Orwell, há uns mais iguais que os outros.